Carta ao sofrimento
- Lisiê Silva

- 6 de nov.
- 3 min de leitura

Este texto não foi escrito com a ajuda de IA (Inteligência Artificial), e faz tão pouco tempo que ela entrou na nossa vida e já estamos sentindo saudade de ler algo que foi escrito de verdade. É... verdade - aquela coisa que só o ser vivo é capaz de experimentar, a realidade.
Seria muito estranho escrever um texto sobre sofrimento usando uma máquina. Claro que ela poderia detalhar com precisão o que é, mas sabe, mesmo assim não vivenciou aquilo.
Eu vivi. Doeu chegar lá, encostar naquele lugar que ninguém ousa, aquilo que nem sequer queremos pensar, falar, deixar o outro descobrir. A vontade de não existir. Da dor de existir, do sofrimento acabar. E se a dor é na alma, como curar o existir?
Quando toquei aquele lugar do fundo, consegui palpar o sofrimento, é como se tudo que vivi fosse despido e tudo estivesse na sua forma mais nua e crua. Dói de ver, sentir e ressentir, vivenciar a dor da alma é uma tortura inimaginável para muitas pessoas. Mas é, sem dúvida, o caminho mais rápido para aquilo que sentimos ser a lógica da existência, o porquê de estarmos aqui. E quando o sofrimento é muito muito grande, passamos a questionar justamente o "porquê de estarmos aqui".
Para quem a gente escreve uma carta? para uma pessoa que não está mais perto de nós, mas ainda mantemos uma memória juntos. Uma carta para o sofrimento nos ajuda a perceber que a dor passou, se foi, não existe mais, não faz mais parte da sua realidade do momento, o que está no seu presente é o que você é. Dói sim lembrar, mas ela não é a sua alma, o seu existir.
Proponho nesta perspectiva olhar a dor e o sofrimento sem querer eliminar o existir, sim eu falo aqui do pensamento de morte, do suicídio. Existem diversas formas de sofrimento e não vamos medir qual dói mais, mas há algo em comum, a vontade de eliminar a dor e o sofrimento, o de não existir mais.
Quando tocamos neste lugar especial da alma, as memórias das dores, dos traumas, a dor insuportável, o sentimento de impotência, fragilidade, raiva, revolta, tristeza profunda... é normal que pensemos que podemos enlouquecer com estes pensamentos, ou que devemos "tratar" seja com medicamentos, terapia, ou qualquer coisa que alivie essa dor, em última instância pode-se achar que a única solução seria a de não existir. Primeiro de tudo, te proponho escrever esta carta para o seu sofrimento. Pode ser uma carta mental, converse com os seus sentimentos, dores, memórias e vá cada vez distanciando o seu existir, o que és agora, do que foi.
Depois, observe o seguinte, a cada dia o sol nasce para nos lembrar das novas chances, de recomeços, de novo e de novo, todos os dias podemos recomeçar. A vida recomeça, se inicia e se despede, acorda e dorme, nasce e morre naturalmente, não há necessidade de antecipar nada. Sinta-se acolhido pela vida, despeça-se dos sofrimentos que não existem mais, acolha, nomeie, mande cartas, chore, mas deixe a vida fluir seu curso. Não é tão simples assim, eu sei, isso pode durar dias, semanas, meses, anos, uma vida inteira... mas posso te garantir, não há sofrimentos que dure para sempre, é uma questão de perspectiva.
Se mesmo assim está difícil sair deste emaranhado de pensamentos, dores, e o sofrimento aumenta cada vez mais, peça ajuda: de uma pessoa de confiança, de um profissional, as terapias podem ser sim revolucionárias na vida de uma pessoa. E se mesmo assim continuar, existem outros modos de cuidado, de acolhimento, de terapias alternativas. E se ainda assim nada te ajudar, formas mais drásticas que são os medicamentos psicotrópicos. Mas devo te alertar! Estes medicamentos nunca devem ser utilizados como primeira escolha, somente quando as outras alternativas falharam. Eles geralmente nos ajudam a lidar melhor com as dores, mas eles não "tratam" esses sofrimentos. Esses medicamentos também podem trazer outros problemas ou reações adversas. Estes medicamentos não te "melhoram", não te "corrigem", nem te "curam", então não confie a sua saúde somente a eles, integre tudo que pode te ajudar.
A vida é conexão, e com o que hoje estas conectado?
Lisiê Silva, Farmacêutica clínica




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